Ativista que está correndo 200 maratonas para combater a crise mundial da água desembarca no Brasil para correr na Amazônia

São Paulo, 30 de janeiro de 2022 — A australiana Mina Guli se descreve como uma relutante corredora de ultramaratona. O termo “relutante”, nesse caso, é muito bem aplicável, uma vez que ela está correndo 200 maratonas no período de um ano com o objetivo de aumentar a conscientização sobre a crise mundial da água. Em 22 de março de 2022 — Dia Mundial da Água — a atleta-ativista de 52 anos se preparou para a primeira corrida de seu épico desafio #RunBlue. A campanha tem inspirado empresas e engajado pessoas a praticarem ações efetivas para os cuidados com esse recurso. A data escolhida para o início do projeto também marca exatamente um ano antes da realização da Conferência da Água da Organização das Nações Unidas 2023, que será realizada no dia 22 de março, em Nova York.

A grande novidade é que, neste mês de janeiro, o Brasil passa a integrar a lista de países em que Mina correrá. O local escolhido foi a Amazônia. De acordo com um estudo realizado pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) e publicado na revista Nature, em junho de 2021, o avanço do desmatamento na Amazônia e em outros biomas brasileiros pode ser decisivo para que o país fique condenado a experimentar crises hídricas sucessivas, a despeito de ser o lugar com o 2º maior patrimônio hídrico potável do planeta.

Empresas possuem papel fundamental na crise hídrica global

Além de sua idealização pessoal, Mina estabeleceu a meta de conseguir o apoio de empresas dispostas a avaliarem seus riscos hídricos, entenderem onde precisam melhorar e implementarem um plano de ação concreto para melhorar o uso da água. “Eu me envolvi com a água porque fiquei absolutamente horrorizada com o fato de estarmos vivendo uma crise global e não falarmos sobre isso. Por que a água não é notícia de primeira página? As nossas zonas úmidas estão desaparecendo três vezes mais rápido do que nossas florestas”, alerta.

Até o momento, a maratonista completou 150 corridas, cada uma com 42.195 quilômetros de extensão. Quando finalizar a última etapa, ela terá percorrido 8.439 quilômetros, o equivalente a correr do Marrocos ao norte da Estônia. Ainda para fins de comparação, a distância entre o Oiapoque (AP) e Chuí (RS), cidades localizadas nos dois extremos do Brasil, equivale a cerca de 7.100 quilômetros.

Mina, uma ex-Líder Global do Fórum Econômico Mundial, é atualmente CEO da Thirst Foundation, uma organização sem fins lucrativos que promove ações contra a crise da água. Ela se interessou pela questão pela primeira vez enquanto trabalhava como advogada em Melbourne, mas rapidamente ficou frustrada com a falta de atenção que o assunto recebia. “Temos uma grande questão hídrica que vai muito além de banheiros e torneiras e afeta profundamente as cadeias de abastecimento, sociedades e economia”, adverte.

A ativista nem sempre foi um atleta. Na verdade, ela evitou o esporte quando criança, voltando-se para os trabalhos escolares e a música. Porém, a também empresária decidiu usar as maratonas como uma forma de engajar as pessoas na questão da crise da água. Em seus desafios anteriores, em 2016, ela correu 40 maratonas em sete desertos e sete continentes, durante sete semanas. Em 2017 foram 40 maratonas ao redor de seis rios em 40 dias. Em 2018, ela tentou 100 maratonas em 100 dias, mas quebrou a perna na 62ª corrida. Mina já completou maratonas na Austrália, Ásia Central, África, Turkiye, Europa, Oriente Médio, Peru e Bolívia. Recentemente, inclusive, correu no Egito durante a COP27, onde destacou a importância dos ecossistemas aquáticos e da água doce para a ação climática.

Durante suas corridas, Guli conheceu mulheres que caminham quilômetros para buscar água, crianças quenianas que ficam em casa sem ir à escola para esperar a entrega de caminhões-pipa e pastores beduínos que passaram “dias sem acesso à água”.

Quão grave é a crise hídrica?

A crise hídrica mundial é um problema que se torna cada vez mais grave em todo mundo. Em muitos países não existem torneiras, poços e tubulações que forneçam água potável. Segundo relatório do Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF) e da Organização Mundial da Saúde (OMS), divulgado em 2020, uma em cada dez pessoas — quase 800 milhões no total — não tem acesso à água potável. Todos os dias, mais de 800 crianças com menos de cinco anos morrem de diarreia causada por água contaminada e falta de saneamento.

À medida que as mudanças climáticas tornam as secas mais frequentes, o abastecimento de água vulnerável está sob pressão crescente. Dezessete países – que abrigam um quarto da população mundial – enfrentam níveis “extremamente altos” de estresse hídrico básico. Até 2050, cerca de 60% dos habitantes do mundo provavelmente enfrentarão escassez de água. Em outras partes do mundo, o problema não é a falta de água – é o excesso. De acordo com um relatório da WaterAid, 650 mil mulheres grávidas em áreas afetadas por enchentes no Paquistão não têm acesso a cuidados reprodutivos sanitários.

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