Minha resolução de ano novo para a vida corrida em 2024

Mais um ano vai, outro ano vem, rolou tanta coisa e… tudo bem! Se você pensou, mas não realizou… tudo se resolve no ano que vem…

Alerta: esse início de texto não é autoral. Se você, assim como eu, viveu sua pré-adolescência em 1990, deve ter lembrado que se trata de um trecho de uma propaganda da época. Pasme, uma propaganda de cerveja, mais precisamente da Brahma. Clique aqui se quiser reviver a nostalgia publicitária-musical ou entender do que estou falando se for mais jovenzinho ou jovenzinha.

Mas quem diz virada de ano, diz resoluções! É a tradição! Gosto dessa coisa de ciclos que se terminam para que outros comecem. Sendo corredora, eu vivo na base dos ciclos, não tem jeito. A diferença é que com um ano novo com bônus (afinal, é bissexto!), eu começo a pensar sobre como correr para realizar novas conquistas entre 1º de janeiro e 31 de dezembro.

O balanço de 2023

Em 2023, fiz todas as provas que havia previsto. Foram um sucesso? Vou responder como os treinadores que passam pelo PFC respondem: depende.

Fala sério, Ana? Como assim, depende?

Se eu levar em conta os objetivos de tempo que me dei, a resposta seria curta e grossa: NÃO. Fui SUPRA em todas as provas. SUPRA-2 na meia, SUPRA-4 na maratona. Apenas nas provas de 10k, para as quais não tinha alvo de tempo algum, considero que me saí bem. Nessas, fui SUB-1. Oh, glória!

Por outro lado, se eu levar em conta o que aprendi sobre mim mesma no processo, a resposta é: SUCESSO ABSOLUTO! Corrida e autoconhecimento caminham no mesmo ritmo, são parceiros virtuais. E usando aqui uma gíria das antigas:

Fico amarradona no meu processo de desenvolvimento pessoal pelo movimento! Esse é o meu grande barato e quem já me acompanha há algum tempo sabe disso.

O que tem mais valor? A busca pela performance ou a busca pelo desenvolvimento? Pois é… também depende! E para sair do muro até o final dessa crônica, quero lhes apresentar a ferramenta que adotarei em 2024 para minha vida corrida.

Inspirações: quando o yoga imita a vida

No ano passado, fiz uma prática de yoga lá no meu monastério querido (para entender de onde vem essa história de monastério no meio de uma crônica sobre corrida, leia Chimarathon 2023: Uma de um milhão). A aula começou e o instrutor disse que seria uma prática para trabalhar menos a performance e mais a nossa condição presente. Ele deu exemplos e aposto que se você estivesse lá, teria se reconhecido.

No yoga, existem posturas de diferentes graus de dificuldade e estando num grupo a tendência é querer mostrar que podemos facilmente adentrar o nível Cirque de Soleil sem muito esforço. Basicamente, é aquela mania de querer atingir o ápice de uma postura indo de 0 a 100 como se fosse natural. A tentativa se traduz em algum constrangimento para os envolvidos, mais ainda quando, na maioria das vezes, não se é um praticante mais avançado. Falta equilíbrio, força, flexibilidade e, convenhamos, muitas vezes paciência.

O que esse professor estava querendo dizer, queridos leitor e leitora?

  1. Não subestime o básico: quando bem executado, o efeito é muitas vezes até mais potente.
  2. Não pule etapas: ao respeitar a condição do momento, você desenvolverá muito mais equilíbrio, força, flexibilidade e paciência. Comece pela fundação, não pelo último andar.

Sendo amante do processo, entrei fácil na onda da prática e fiz questão de não performar. Pelo menos, não do jeito errado. A meu ver, existe uma forma mais adequada de atingir um novo patamar de potencial, na corrida ou no que você quiser.

Apresentando o Shoshin

Eis a ferramenta! Sim, fui buscar referências lá no Oriente e com a turma de monges tibetanos, pois acredito que nessas coisas, eles estão mais avançados que nós.

Shoshin nada mais é do que o termo do Zen Budismo que significa mentalidade de aprendiz. E o que significa isso na nossa vida louca vida, vida breve, como diria Lobão?

A mentalidade de iniciante é uma forma de levar a vida, com menos pre-concepções e mais abertura às experiências. Voltemos à nossa infância por alguns minutos. Quando tudo era mato e menos validação externa, o mundo era um laboratório.

Tudo atraía nossa curiosidade, dos sons e cores à areia do parquinho que parecia ter um gosto muito bom. Aprender a andar (caindo trocentas vezes), a falar (trocando o R e o L, o que era até bonitinho), se surpreender com as coisas mais triviais (como uma garrafa plástica vazia e o alto potencial de entretenimento) eram as regras para evoluir. Biomecânica do movimento, dicção clara e correta, objetos úteis e inovadores… essas coisas não tinham a menor importância. A gente ia do ponto A ao ponto B e se fazia entender mesmo que balbuciando palavras e ainda inventava novos usos para objetos despretensiosos.

Com o tempo, entramos na tal da roda do Hamster e aí vem aquela performance forçada da aula de yoga, que considero o jeito errado de performar. Trazendo para o nosso universo da corrida, isso me fez pensar sobre o que acho que já sei. Pouco importa a fonte do saber, mas até que ponto, hoje, eu me permito explorar outras possibilidades? Será que já sei tudo que preciso sobre correr? Será que já alcancei o meu máximo potencial? Ou será que concluí que a estagnação é inevitável já que os resultados não vêm?

Em 2024, eu vou…

Quantas vezes no PFC Debate recebemos comentários de pessoas que questionam por que após tantos anos de corrida, ainda precisamos de treinadores? Afinal, segundo essa cartilha, deveríamos já saber tudo sobre como treinar. Ou ainda sobre como não atingimos determinados resultados? Afinal, mais de 10 anos de corrida, tinha que correr melhor. Ou pior: certezas sobre o que define ou não um corredor “de verdade”? Afinal, é o tempo que define o seu valor, não a distância e nem suas condições para completá-las.

Acho perigoso quando entramos, de certa forma, na esfera da expertise pura ou do “você-já-deveria-saber”. Porque quanto mais nos especializamos, ou mais certezas pensamos ter, mais tendemos a restringir nossa visão de mundo e menos valorizamos as pequenas coisas e conquistas.

O que proponho aqui não é um mundo de generalistas ou de pessoas rasas, ao contrário. Existem momentos na vida em que talvez a gente deva divergir para voltar a convergir, já que cada um é o centro do seu universo o que pode contribuir ou não para o próprio equilíbrio. Pessoalmente, é o que pretendo fazer na corrida. Explorar as possibilidades de mente aberta.

… buscar performance ou desenvolvimento?

Por mais que goste da sofrência das longas distâncias, quero me dar a oportunidade de me descobrir numa modalidade de curta duração, enfrentar meus monstrinhos interiores que insistem em dizer que eu não gosto de fazer força ou que não levo tanto jeito assim para a coisa. Por que não dedicar um ano inteiro a me conhecer mais no modo intensidade que resistência? Pois é isso que quero descobrir em 2024.

Respondendo à pergunta lá de cima: quero buscar uma Ana performante que eu ainda não conheço.

Termino com essa frase emprestada do nosso grande Guimarães Rosa (que ficou conhecido como um grande escritor, mas que também foi médico, diplomata e poliglota):

Todo caminho da gente é resvaloso. Mas; também, cair não prejudica demais – a gente levanta, a gente sobe, a gente volta! (…) O correr da vida embrulha tudo, a vida é assim: esquenta e esfria, aperta e daí afrouxa, sossega e depois desinquieta. O que ela quer da gente é coragem.

Tenhamos a coragem de acreditar em mais possibilidades do que limitações. De termos menos certezas e mais curiosidade. De aprender a desaprender. A rever conceitos e fazer descobertas sobre o que nos move. E que a corrida seja um meio e não um fim. A vida acontece entre o movimento e as pausas. Feliz ano novo para você!

Obrigada pela leitura.

4 thoughts on “Minha resolução de ano novo para a vida corrida em 2024

  1. Oi Ana! Gostei muito! É isso que aprendi a buscar depois de tantos anos de experiências… depois dos 45…50… estou a cada dia vendo e sentindo a importância de se abrir para possibilidades, experiências, aprender movimentos novos, modalidades novas ou até mesmo novas experiências nas velhas modalidades. Sempre tem o que aprender. O que temos que fazer é nos abrir, nos permitir como se fôssemos crianças, e ir descobrindo as novas possibilidades sem regras, sem nada engessado. É uma delícia!
    Bom ano pra nós!!!

    1. Oi Duda! É isso: ser fluida na vida. Existem tantas oportunidades de fazer a mesma coisa de um jeito diferente, né? Pra que se limitar? Na pior das hipóteses, vamos aprender coisas novas sobre nós mesmas. Abraço carinhoso!

  2. Mas uma crônica sensacional! A leitura me fez refletir no que eu quero e espero de 2024, não somente em termos da corrida mas também na vida profissional e pessoal.
    Vamos ver o que esse ano nos trará, estou entrando sem muitas expectativas e deixando um pouco a “vida me levar”, no entanto tenho algumas metas e objetivos para atingir!!

    1. Oi William! Gosto da vibe Zeca Pagodinho. Podemos intercalar momentos deixa a vida me levar, com outros mais “premeditados”. O legal é encontrar um equilíbrio entre as duas coisas para realizar o que desejamos. Sem ação, as surpresas da vida não se revelam. Abraço carinhoso!

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